5 de mai. de 2010

CATÁSTROFE ECOLÓGICO NO GOLFO DO MÉXICO

Para enfeitar a beleza desta tragédia eis um poema:

Pálpebras de pedra
Não observam estrelas…


Cães de esófagos podres,
Ladram nas esquinas
Do tempo…

Com fatos Armanni,
Traficam peçonha
Nos becos do Mundo,


Crânios conspurcados ,
Dinheiro ensanguentado

Bailam demónios,
Em festividades necrófilas

Um comentário:

Anônimo disse...

HORROR E BELEZA


A foto, um simples e inocente instantâneo, mostra o efeito do desastre ambiental na sequência da explosão no golfo do México de uma plataforma petrolífera, que originou uma gigantesca maré negra que ainda hoje continua sem solução à vista ao que julgo saber. Sucederam-se os comentários indignados, diria mesmo justamente indignados. Apesar de concordar com a onda de indignação, não pude deixar de observar na fotografia algo de diferente. As tentações do olhar, que, nas suas derivas, constroem inevitáveis ficções. Ou seja, vejo no efeito de 'pareidolia' que a mancha construiu momentaneamente, e que a câmara do fotógrafo registou, o que segue.
Observando atentamente vejo com clareza no lado direito da foto um rosto azul de perfil (cabelos, olhos, nariz e boca, cabeça inclinada sobre o lado direito, um rosto que eu chamaria ‘in-blue’ pelos tons de azul que o compõem, mas também pela tranquilidade que xala da figura dominando-a, como que adormecida; também aqui o sono não deixa de ser sugestivo, ou seja, alguém que dorme, e sonha (podendo tratar-se de um pesadelo, metáfora paradoxal daquele que está a contecer neste momento), sonho/pesadelo a pairar sob a forma de duas manchas acastanhadas e ocres a romper do azul, ao centro e à esquerda da foto); ao centro emerge nitidamente uma segunda figura, de mulher, a dançar um batuque (ta da ku tornu), ou a ensaiar um conhecido passe do nosso ‘Kolá San Jon’ (braços erguidos, peitos esticados, nádegas tensas a anteceder o contacto); também pode ser, mais prosaicamente, a imagem de uma mulher a despir-se. Num e noutro caso há uma linha irregular de luz, eléctrica, electrizante, provocadora, que vindo do lado esquerdo da foto (a mancha da esquerda é uma fonte de mistério para a composição do conjunto) amarra, une, enlaça, lança, injecta, ou será ejacula, um jacto seminal, declaradamente erótico, que atinge a mulher de forma insinuante e provocadora no baixo-ventre. Afinal, a figura que dorme sonha, sonha com algo que lhe é caro, a dança, ou um irreprimível desejo erótico de se despir. Ambas (as atitudes) são centros de desejo e fontes de prazer. Ambas apontam para duas situações declaradamente felizes. Eis o meu filme.
Eis o que, no coração do horror, encontrei. Um olhar de esperança, apesar de tudo! No coração das trevas desta mancha líquida, cuja sombra avança para as costas próximas com seu selo de morte, uma espécie de tsunami silencioso, algo de belo aconteceu. À luz desta leitura, como então entender Platão quando, no ‘Filebo’ 65 A, escreveu “A força do Bem refugiou-se na natureza do Belo.”. Por vezes o Belo pode refugiar-se também no coração do ‘Mal’. Ou não?

Abraço (esteticamente) fraterno
ZCunha